Jornalismo Esportivo x jornalismo esportivo
Poucos segmentos do jornalismo profissional merecem um percentual tão alto das críticas recebidas como o jornalismo dedicado ao futebol brasileiro.
A manchete em busca do clique fácil, a polêmica artificial, o clubismo institucionalizado porque rentável, o jornalismo-parça, o despreparo sob a aura da informalidade acessível, o post populista, as falsas notícias de mercado...
São inúmeras as mazelas, existem tantas outras, e para cada uma delas caberiam abordagens específicas sobre suas razões e mecanismos.
Grosso modo, porém, estamos quase sempre tratando da busca por engajamento, essa palavra do novo milênio que não só superou a relevância do conteúdo como tomou seu lugar: são os índices de engajamento, e não mais o teor de conteúdo, a determinar a relevância de uma reportagem ou análise.
Não falta nesse meio quem busque declaradamente e acima de tudo, com táticas conhecidas tão discutíveis quanto eficientes, um aumento no número de seguidores para faturar mais com #publis. A relação mercantilista é agora direta, e o valor do engajamento tornou-se bem maior que o do bom conteúdo.
Ficam assim liberadas e até estimuladas, inclusive por grandes empresas que não precisariam disso, as frases de efeito sem nexo ou embasamento, as acusações tão tolas quanto irresponsáveis a profissionais de futebol, as manchetes que omitem ou fazem charada com o sujeito, a ditadura da contundência, a burrice, as perguntas infantilizadas elevadas à categoria de “conteúdo”.
“Atlético ou Flamengo, qual clube é maior?”; “Ex-Corinthians vai jogar em gigante europeu graças a palmeirense”. “Fulano afinou, beltrano pipocou”. E dá-lhe informação chutada, perguntas que só pretendem provocar, festivais de clichês e bordões vazios, perdigotos e socos na mesa, veias saltadas e adjetivos duros aplicados a temas irrelevantes.
Está ruim na média, apesar de muita gente boa por aí.
É isso que torna ainda mais lamentável a opção de muitos torcedores supostamente interessados no nível do jornalismo esportivo em depreciar conteúdo produzido de forma séria por se incomodar com seu teor – mesmo que verdadeiro.
Foi assim com a recente reportagem de Danilo Lavieri, do portal UOL, ao noticiar recente consulta do Palmeiras à Adidas e apontar a falta de profissionais no reformulado departamento de marketing do clube. As cifradas, vagas e indiretas respostas do Palmeiras deveriam fazer pensar os que resolveram atacar o portador da informação que o clube nem sequer negou.
A mídia segmentada, muitas vezes apontada como vilã por trabalhar para um público específico e precisar atender aos seus anseios e preferências acima de tudo, também sofre com o problema quando faz jornalismo sério: as críticas ao portal Meu Timão por publicar informações sobre lesões ou escalações omitidas pelo clube são um bom exemplo.
Num panorama em que Canais de Fulanos (alguns remunerados por clubes importantes e abonados) se prestam a fazer perguntas amigas em coletivas de imprensa e serviço sujo atacando profissionais nas redes sociais, o trabalho do Meu Timão deveria ser exaltado, e não condenado por divulgar fatos.
Talvez mais absurda seja a agressividade voltada a competentes comentaristas táticos por fazer seu trabalho, ou seja, ilustrar de maneira didática ao grande público as virtudes e fragilidades dos principais times do país. Há quem se incomode com a função, acreditando que ela possa facilitar a vida de adversários dotados de profissionais e departamentos criados exclusivamente para fazer esse mesmo trabalho.
Mas o melhor exemplo de conteúdo relevante tratado com sanha e animosidade é o que faz rotineiramente o jornalista Rodrigo Capelo, do GE, ao abordar as finanças dos clubes brasileiros. Quando ele e Gabriela Moreira publicaram, em 2019, a série de reportagens denunciando as falcatruas e irresponsabilidade da antiga gestão do Cruzeiro, não faltou quem os colocasse no mesmo balaio dos sensacionalistas, irresponsáveis e clubistas. O resultado do que foi escancarado está aí, na situação do clube mineiro.
Citei quatro exemplos positivos, poderia citar mais.
No Brasil de 2022, o ataque indiscriminado a jornalistas, ao jornalismo e aos seus veículos não chega a surpreender e não é exclusividade do esporte. Mas quem se preocupa verdadeiramente com a baixa qualidade do jornalismo esportivo precisa saber fazer distinção entre quem é sério e quem só busca engajamento. Porque quem faz críticas motivadas apenas por razões clubísticas está agindo exatamente como boa parte daqueles que critica.
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